O desenvolvimento de plantas com tolerância à seca é uma das estratégias para adaptação às mudanças do clima. O trabalho dos melhoristas para obter cultivares com essas características foi tema do painel “Respostas fisiológicas e melhoramento para tolerância à seca”, no 10º Congresso Brasileiro de Soja e Mercosoja, em Campinas (SP).
Gustavo Maia Souza, professor da Universidade Federal de Pelotas, abriu o painel mostrando a complexidade dos mecanismos fisiológicos das plantas para enfrentar a seca. O entendimento desses mecanismos é a base do melhoramento genético para plantas tolerantes ao estresse hídrico, seja via edição gênica, transgenia ou seleção via fenotipagem.
A fotossíntese é sempre inibida em condições de estresse, o que causa efeitos nas plantas. Quando leva à fase de exaustão, os danos podem ser desde perda de produtividade à morte. Contam nesse processo não só a intensidade do estresse, mas também a duração e reincidência dos eventos.
Um fator não ocorre de forma isolada e acaba levando a outro em um efeito cascata, tornando mais difícil o entendimento e intervenção. Por exemplo, o aumento da incidência solar leva ao aumento de temperatura, que aumenta a evapotranspiração, reduzindo a água disponível para a planta.
“É uma situação antagônica em que a planta fica. Se ela transpira, perde água. Se fecha os estômatos, absorve menos CO2, o que limita a fotossíntese, e aumenta a concentração de oxigênio nas células, causando uma série de oxidações prejudiciais a ela”, explicou Gustavo Maia Souza.
Um complexo sistema de sensores nas células e de conexões elétricas faz com que a regulação da planta seja feita de forma sistêmica. Outros mecanismos ainda pouco conhecidos envolvem uma “memória” da planta, que aprende a se comportar em caso de repetição de uma situação de estresse. E essa aprendizagem pode ser passada entre gerações e entre plantas.
Alexandre Garcia, da Bioceres Crop Solutions, exemplificou falando em “plantas otimistas”, que direcionam a energia para o sistema reprodutivo esperando que o período de escassez hídrica seja curto, e as “plantas pessimistas”, que são aquelas que reduzem a atividade vegetativa como forma de economia de recursos.
O entendimento dos genes que levam a cada comportamento é importante no processo de edição gênica. De acordo com ele não é interessante que uma planta supere um estresse hídrico mantendo um bom porte vegetativo se ela não for produtiva, por exemplo.
Para se chegar a uma cultivar é preciso ter testes de campo e a reprodução de efeitos de seca em ambiente não controlado é difícil. Até mesmo em pesquisas de fenotipagem, a simulação de diferentes gradientes de chuva com uso de irrigação não é fácil.
Na Embrapa Cerrados sensores vêm sendo utilizados tanto em equipamento móvel no chão quanto em drone para auxiliar nas pesquisas. O pesquisador Walter Ribeiro Junior apresentou alguns dos estudos feitos com soja, trigo, milho, café, entre outras culturas.
Esse trabalho ajuda a selecionar materiais mais tolerantes ao estresse hídrico e que possam ser utilizados em combinação com técnicas de edição gênica e transgenia.
De acordo com os participantes do painel, não há uma solução única e a redução dos riscos de perdas por estresse hídrico passa pela integração de diferentes técnicas de melhoramento genético, disponibilidade de bom germoplasma e adoção de boas práticas agropecuárias que aumentam a infiltração e minimizam a perda de água no solo.
“O problema do aquecimento global está aí e só tende a aumentar. Não é algo fácil de se solucionar, mas qualquer ganho já é relevante”, resumiu Liliane Henning, moderadora do painel e pesquisadora da Embrapa Soja.
Alexandre Garcia ressaltou que em situação de estresse hídrico sempre haverá perdas, não sendo possível manter o teto produtivo.
“O gene de tolerância pode ser ativado ou não. Se chover bem na safra, ele não fará diferença. Se houver seca, ele pode funcionar bem ou a seca pode ser tão forte que ele não resolva. Como não temos como prever a chuva, o produtor pode não perceber o valor desta ferramenta”, afirmou.
O 10º Congresso Brasileiro de Soja e Mercosoja é promovido pela Embrapa Soja e vai até esta quinta-feira, no Expo Dom Pedro, em Campinas (SP). Esse é o maior fórum técnico-científico do complexo da soja, reunindo cerca de 2 mil participantes de todos os setores da cadeia produtiva.