O que muitos países do mundo passaram a chamar recentemente de “agricultura regenerativa” já faz parte do cotidiano do produtor brasileiro há mais de duas décadas. O contraste entre a realidade do campo no Brasil e a forma como essa agricultura ainda é mal compreendida em fóruns internacionais foi um dos temas centrais do painel “A resiliência climática começa com as sementes – nosso caminho rumo à COP30 no Brasil”, realizado nesta segunda-feira (20) durante o World Seed Congress 2025, em Istambul, Turquia.
O debate reuniu representantes da indústria de sementes, de organizações multilaterais e produtores rurais para discutir o papel das sementes na construção de uma agricultura mais resiliente às mudanças climáticas. Mas foi a cobrança por reconhecimento e maior protagonismo do Brasil que mais chamou a atenção.
Representando os produtores rurais brasileiros, o jovem agricultor Rafael Riedel trouxe ao centro do debate uma crítica direta à falta de compreensão da realidade agrícola tropical por parte de outros países. “Falei sobre como a agricultura brasileira muitas vezes não é compreendida em ambientes aqui fora. Já aplicamos práticas chamadas hoje de agricultura regenerativa há mais de 20 anos. Plantio direto, plantio de cobertura, manejo de solo... tudo isso já faz parte da nossa rotina”, afirmou. “O problema é que às vezes querem impor regras sem entender nosso ambiente local, sem escutar quem realmente está no campo.”
Riedel também reforçou a necessidade de dar mais visibilidade à tecnologia embarcada nas sementes. “A semente é onde tudo começa. É preciso ampliar a consciência sobre o que são os transgênicos, as NGTs, os processos de melhoramento. Há muitas tecnologias que já usamos, mas que são pouco faladas, até mesmo dentro do agronegócio.”
Cristiane Lourenço, diretora global de cultura regenerativa para o departamento de sementes da Bayer, destacou a importância de inserir a semente como tecnologia central na agenda da COP. “Hoje, a ideia era começarmos a discutir o papel da indústria de sementes e da semente como tecnologia essencial para a agenda climática. Falamos sobre como ela pode apoiar a mitigação dos impactos das mudanças do clima e, principalmente, a adaptabilidade dos produtores, que é uma das principais pautas dos próximos anos.”
Cristiane também reforçou a importância de atuação conjunta entre organizações e da presença ativa do setor nas negociações globais. “O ponto comum mais forte foi a necessidade de trabalharmos juntos para representar o setor nas COPs e nos espaços de diálogo com governos e sociedade civil. Tecnologias como o tratamento de sementes precisam ser visíveis na pauta climática global”, afirmou.
Lloyd Day, vice-diretor geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), reforçou a mensagem de que a agricultura deve ser vista como parte da solução, e não como vilã da crise climática. “A ciência é a base da política pública. E a agricultura é vital para a vida humana. Ela cuida do planeta de formas que muitas pessoas ainda não compreendem”, afirmou. “As sementes são o veículo da inovação. Elas ajudam a enfrentar tanto os desafios climáticos quanto os nutricionais. Levar essa mensagem à COP30 é essencial.”
Para Day, a realização da COP30 no Brasil é uma oportunidade estratégica. “O mundo terá diferentes agendas em Belém, mas do ponto de vista da agricultura, é hora de mostrar tudo o que o Brasil e as Américas estão fazendo para proteger o planeta e alimentar o mundo. Precisamos de tecnologia para produzir mais com menos. Isso é intensificação sustentável – e começa com a semente.”
Atta Santosh, presidente da International Seed Federation, organizadora do evento, completou o panorama com um alerta sobre a urgência do tema. “Não estamos falando apenas de produtividade, mas de sobrevivência. A indústria de sementes precisa estar no centro da transformação que queremos ver nos sistemas alimentares e na resposta global ao clima.”
O painel encerrou com uma mensagem convergente entre indústria, produtores e instituições multilaterais: é preciso ampliar a presença das sementes nos fóruns globais e reconhecer seu papel como tecnologia-chave para a segurança alimentar, a mitigação dos impactos do clima e a construção de sistemas agrícolas mais resilientes.
O World Seed Congress 2025 segue até esta quarta-feira, 21 de maio, reunindo especialistas de mais de 70 países para debater o futuro da agricultura global.